Vender é atitude – Caso Miguel

O ano era 1973. Tendo vendido doze cursos de inglês, num só dia, na Ford São Bernardo, recebi uma indicação para oferecer para um gerente na Ford Ipiranga.

Chegando à sala indicada como dele, encontrei uma secretária sentada e um senhor ao seu lado.

Parei na porta:

– O senhor Mauro Cicarone, por favor.

A secretária respondeu, que ele não estava.

Fiz então uma cena: Estendi o braço esquerdo, para que o relógio aparecesse de dentro da manga do paletó. Olhei firme para o relógio como se estivesse preocupado com o horário.

Na verdade, não havia marcado hora.

O senhor, ali presente, se ofereceu:

– Posso ajudar em alguma coisa?

Olhei de cima a baixo, respondi:

– Depende, quem é o senhor?

– Sou o Miguel, trabalho com o Mauro.

Eu disse, então, que tinha passado pelo departamento de marketing na fábrica de São Bernardo e havia recebido uma indicação para falar com o Mauro sobre o curso de inglês que eles (de marketing) estavam fazendo.

Ele perguntou: – Como é isso?

Como ele continuava de pé, ao lado da secretária, eu não achei conveniente falar ali mesmo.

– Pois bem, onde podemos conversar? Dando a entender que gostaria de falar em outro lugar.

Ele me indicou a sala ao lado. Ao passar pela porta, li:

Antônio Miguel – diretor de vendas.

Comecei a apresentação falando os nomes dos colegas de marketing que já estavam fazendo o curso e fiz a apresentação de como o curso funcionava.

Quando falei que o curso tinha aulas que deveriam ser preparadas, ou seja, tinha que estudar, o Miguel disse que não servia para ele que não gostava de estudar. Parei, olhei bem nos olhos dele, e disse:

– Para com brincadeiras, o senhor não é diretor à toa. Deve ser muito bom no que faz. E continuei minha demonstração.

Quando chegou no fechamento, ao argumentar o preço de uma aula particular (seria na média 80 cruzeiros, na época), ele disse, quinze cruzeiros.

Sem olhar para ele, comecei, acintosamente, recolher todo material do curso, espalhado sobre a mesa; e falei alto e em bom tom.

– Desculpe-me, mas eu tenho mais o que fazer. O senhor está querendo brincar comigo.

Ele interrompeu:

– Tudo bem, minha mulher dá aula de francês e cobra 60 cruzeiros.

Perguntei se ela era francesa. Ele disse que não, só estudou na Aliança Francesa.

Voltei ao assunto, dizendo que nossos professores eram todos nativos, portando poderiam cobrar no mínimo oitenta.

Dirigi para o fechamento, fiz os cálculos do quanto ele iria pagar e pedi o número do cheque para colocar no contrato. Ele fez o cheque, assinou o contrato, e assim que eu fechei a maleta e estendi a mão para me despedir, ele me segurou.

– Espera aí. Você vendeu, agora em vai vender sou eu. Senta aí.

Falou então do Consórcio Nacional Ford e me intimou:

– Vou lançar o consórcio no Mato Grosso e você vai treinar meus vendedores.

Tentou me aliciar, falou do salário, dos benefícios, do carro novo designado, das viagens, até o valor das diárias. O salário era de dois mil e quinhentos cruzeiros.

Com todo respeito que merecia o meu cliente, tirei do bolso o holerite do mês anterior: Onze mil de comissão de vendas.

Não havia mais argumento, mas ele não se deu por vencido:

– Mas um dia isso acaba, aí você vem trabalhar comigo.

Para mim foi muito bom mostrar o serviço sério e bem-feito ao ponto de ser reconhecido como profissional competente. Ainda mais por um diretor de vendas.

Realmente, por má administração, a escola foi de mal a pior e dois anos depois, procurei o Antônio Miguel para entrar na Ford.

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