“A ciência é uma ação coletiva e um produto histórico”, diz Bombassaro (1995:41) remetendo aos estudos de Thomas Kuhn e Ludwik Fleck. Os fatos científicos não surgem de uma atividade solipsista, do trabalho isolado de um cientista, mas é produto de uma época, de um contexto, de uma circunstância específica. E continua Bombassaro (1995:45):
Assim o conceito de paradigma interpretado sociologicamente explicita a própria estrutura da comunidade de investigação, pois constitui o elemento de agregação dos participantes da comunidade. As tradições de investigação, nas quais se realiza a investigação cientifica, mantêm-se vivas na medida em que um conjunto de problemas e soluções modelares são aceitos como guia para a ação de todos os membros da comunidade. E o paradigma é aquilo que constitui a própria razão de ser de uma comunidade de investigação que primeiro recebe e aceita as realizações científicas passadas, para depois ajudar a difundir o conhecimento produzido levando adiante a tradição. Podemos dizer até que esse vinculo cria uma relação autoconstitutiva.
A história da psicologia poderia ser focada em qualquer evento do passado remoto, mas, para estes estudos, tivemos que alinhar com o desenvolvimento da civilização ocidental. Daí a importância dos primórdios da civilização helênica e do cristianismo. Foi visto o desenvolvimento do conceito de individualidade e de personalidade dentre os gregos, delineando o entendimento das relações de poder entre as pessoas e grupos. Essa situação tende a se alterar quando mudam as circunstâncias do poder durante a Idade Média quando o modelo deixa de ser humanista para ser teocêntrico.
René Descartes (1596 – 1650) diante a tanto misticismo e meias verdades, propõe um método para estudo:
1. Não aceitar nada como verdadeiro antes de conhecer evidências como tal;
2. Dividir tudo em pequenas parcelas para melhor dominar;
3. Classificar por ordem de grandeza, do menor para o maior, facilitando o raciocínio; e
4. Revisar tudo, com o maior cuidado para não evitar ser levado a erro. Dos seus estudos sobre fisiologia e anatomia, depreendeu a existência da alma separada da “máquina” do corpo.
Augusto Comte (1789 – 1857) vai fundar o pensamento positivista que influencia toda busca da verdade nas ciências.
Wilhelm Wundt (1832-1926) é apontado como o primeiro estudioso da psicologia científica por ter criado um laboratório de experimentos em Psicofisiologia, em 1875, na cidade alemã de Leipzig. Alguns autores o consideram o fundador da psicologia científica, ou psicologia experimental. Pleiteava-se a “libertação da filosofia”, transformando os estudos sobre
psicologia em “fatos científicos”.
Procurou-se a “neutralidade científica” na busca de comprovações a partir de exaustivos experimentos. O mundo vivia uma expectativa que tudo seria explicado pelo paradigma científico da experimentação e previsibilidade.
Conforme Bock (2002) embora a psicologia científica tenha nascido na Alemanha, é nos Estados Unidos que ela encontra campo para rápido crescimento, tais como as abordagens: Funcionalista, de William James (1842-1910); Estruturalista, de Edward Titchner (1867-1927) e Associacionismo de Edward L. Thorndike (1874-1949).
O Behaviorismo
John B. Watson (1878-1958) cunhou o termo Behaviorismo, a psicologia do comportamento. Conforme
Bock (2002: 45): “Watson busca a construção de uma Psicologia sem alma e sem mente, livre de conceitos
mentalistas e de métodos subjetivos, e que tivesse a capacidade de prever e controlar.” Isso objetiva adquirir o status de ciência para a psicologia.
Conforme P.Schultz (2004:6):
Watson argumentou que se a psicologia quisesse ser uma ciência, teria de se concentrar somente nos aspectos tangíveis da natureza humana só o comportamento evidente – e não o consciente – poderia ser o tópico legítimo, Para ele, o consciente não pode ser visto ou experimentado. Consequentemente, como o conceito da alma dos filósofos, o consciente não tem
significado para a ciência.
B.F.Skinner (1904-1990) vai ser o mais importante behaviorista influenciando psicólogos em todas as partes do mundo, partindo para “a análise experimental do comportamento”. Conforme
P.Schultz (2004:352):
Skinner argumentou que os psicólogos devem limitar suas investigações aos fatos, ao que lês podem observar, manipular e medir no laboratório. Isso significa uma ênfase exclusiva nas respostas observáveis que uma pessoa avaliada fornece e nada mais. A alegação de Skinner era que a psicologia é a ciência do comportamento, do que um organismo faz.
Skinner fez experiências com pombos e ratos, considerando que animais respondem melhor a estímulos. Admitia que o comportamento humano era mais complexo que o de animais como ratos e pombos, mas acreditava que a diferença estava somente no intensidade e não no tipo. Acreditava que os processos fundamentais eram similares.
O comportamento reflexo ou respondente, não voluntário, são interações do indivíduo com o ambiente independentemente ao processo de “aprendizagem”. É basicamente a ação do meio sobre o organismo.
Respostas produzidas ou originadas a partir de estímulos ambientais específicos. Exemplo: O cão saliva ao ver ou sentir o
cheiro da carne. ( ver: http://www.humornaciencia.hpg.ig.com.br/biologia/pavlov1.htm)
Ivan Pavlov (1849 – 1936) Cientista russo, prêmio Nobel 1904, pelos trabalhos com glândulas digestivas. Autor de estudos sobre reflexos condicionados.
Reforço ou Reforçamento – o ato de fortalecer uma resposta com adição de uma recompensa, aumentando a probabilidade de que a resposta seja repetida.
Exemplo: O adestrador dá um biscoito ao animal, cada vez que executa uma ação desejada.
Extinção é quando as ações não são mais reforçadas e o comportamento desaparece.
O comportamento operante é a ação do organismo sobre o meio, inclui o efeito dela resultante e um reforço (positivo ou negativo). São ações para mudança do meio ambiente.
Exemplo: o rato aprende a acionar uma alavanca para ganhar alimento. Ao colocar um rato faminto numa caixa, ele não sabe agir sobre o ambiente nem tem nada no ambiente que o pressione para alguma coisa. O rato começa explorar o ambiente,
cutucando tudo que aparece a sua frente. Acidentalmente o rato toca numa barra, um grão de ração cai na caixa. Quando o rato percebe que ao tocar na barra, recebe a ração. Ocorreu um aprendizado. Tocar na barra para receber ração não é um comportamento natural, nem reflexo, mas um comportamento aprendido por um condicionamento operante.
Avaliação do comportamento em Skinner
Observação direta – Com um programa abrangente de observação do comportamento pode-se organizar um esquema condicionamento para modificação do comportamento.
Auto-relatos – Testes ou questionários que podem indicar indícios de comportamentos a serem reforçados ou extintos. (TAT – Teste de Apercepção Temática; teste de Rorschach)
Mensuração fisiológica – São avaliadas os efeitos fisiológicos, tais como alteração cardíaca, respiratória, sudorese, rubor, etc.
Conforme P.Schultz (2004:379):
Skinner acredita ser possível obter resultados válidos e reproduzíveis sem o uso de análise estatística, contando que fossem coletados dados suficientes de um único avaliado sob condições experimentais bem controladas. O uso de grandes grupos de avaliados obrigava o experimentador a lidar com comportamento médio. Os dados resultantes poderiam não refletir a resposta comportamental individual e as diferenças individuais de comportamento. Dessa maneira Skinner preferia a abordagem idiográfica à nomotécnica.
Embora ainda muito citada e estudada em meios acadêmicos, mais como história do que embasamento para o trabalho em curso, a teoria de Skinner acabou provocando o nascimento de outras vertentes tais como a psicologia cognitivista, com Albert Bandura (que vai falar de modelagem do comportamento) e Julian Rotter (que vai dizer que a personalidade é aprendida), aceitando-se algo do aspecto mental não observável.
Glossário
Behaviorismo – A escola da psicologia, fundada por John B. Watson, que se concentrava na psicologia como um estudo do comportamento evidente em vez de processos mentais. (Shultz, 2004:6)
Condicionamento operante – O procedimento por meio do qual uma mudança nas conseqüências de
uma resposta afetara a taxa na qual a resposta ocorre . (Shultz, 2004:367)
Humanismo – conjunto de doutrinas fundamentadas de maneira precípua nos interesses, potencialidades e faculdades do ser humano, sublinhando sua capacidade para a criação e transformação da realidade natural e social, e seu livre-arbítrio
diante de pretensos poderes transcendentes, ou de condicionamentos naturais e históricos. (Houaiss, 2001)
Idiográfico – diz-se de método de conhecimento científico ou de disciplina que trata de fatos considerados individualmente, trata de fatos singulares tais como um objeto de arte, um fato histórico. Profundidade de estudo em objeto único.
Nomotécnica – diz-se de método ou disciplina que formula ou trata de leis gerais para o entendimento de um determinado evento, circunstância ou objeto. Ciência que trata das leis gerais como em física, biologia, etc. Relaciona muitos eventos para uma generalização.
Positivismo – sistema criado por Auguste Comte (1798-1857), e desenvolvido por inúmeros epígonos, que se propõe a ordenar as ciências experimentais, considerando-as o modelo por excelência do conhecimento humano, em detrimento das especulações metafísicas ou teológicas; filosofia positiva, comtismo. (Houaiss, 2001)
Solipsismo – doutrina segundo a qual só existem, efetivamente, o eu e suas sensações, sendo os outros entes (seres humanos e objetos), como partícipes da única mente pensante, meras impressões sem existência própria [Embora frequentemente considerado uma possibilidade intelectual (caso limite da filosofia idealista), jamais foi endossado integralmente por algum pensador.] (Houaiss, 2001)
Teocentrismo – doutrina ou crença que considera Deus como o centro de tudo. (Houaiss, 2001)
Referências bibliográficas
BOCK, Ana Mercês Bahia; FURTADO, Odair e TEIXEIRA, Maria de Lourdes Trassi. Psicologias – uma introdução ao estudo de psicologia. 13ª. ed. reform. e ampl. São Paulo: Editora Saraiva, 2002, 368 p.
BOMBASSARO, Luiz Carlos. Ciência e mudança conceitual– notas sobre epistemologia e história da ciência. Porto Alegre: Editora PUCRS, 1995, 124 p
HOUAISS, Antonio. Dicionário eletrônico Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro – Editora Objetiva, 2001 [CD]
VALÉRY, Paul. O pensamento vivo de Descartes. Biblioteca do pensamento vivo. São Paulo: Livraria Martins Editora, sd. 260 p.
P.SCHLTZ. Duane. Teorias da personalidade. São Paulo: Pioneira Thomson, 2004. 530 p.