Psicologia na ACP

Contrapondo as duas tendências anteriores que reinavam na psicologia: a psicanálise, voltada para o ser patológico, a partir de observação de “doentes mentais”; e o “behaviorismo” desenvolvido a partir de experiências com animais, considerando apenas o comportamento “cientificamente observável” buscando generalizando os mesmos resultados para os seres humanos, a psicologia humanista, procura enfatizar a saúde, o bem estar, o potencial de crescimento e a auto realização. Mais ainda, concentra-se no esforço de privilegiar as capacidades e potencialidades características do ser humano, tais como valores, criatividade, sentimentos, identidade, vontade, coragem, liberdade, responsabilidade, consciência, auto realização, etc. É um enfoque que procura enfatizar as possibilidades de uma vida plena.

Sem desconsiderar os avanços científicos de tais escolas anteriores, sem descartar a validade daqueles procedimentos para casos específicos, o humanismo procurou elevar o ser humano ao um patamar mais próprio. O homem não está condenado ao sofrimento eterno impingido por traumas de nascimento e crescimento, função das pulsões e repressões; nem somente aos comportamentos responsivos, instintivos ou condicionados. Ë próprio do ser humano uma vida “humana”, específica, diferenciada, realizada a partir de características específicas e bastante complexas.

Há um otimismo próprio desta visão, criticado por outras abordagens, pois valoriza o ser em si, o ser sendo, o ser se fazendo. A “ciência do comportamento” limita o homem às possibilidades de resposta do corpo, aos mecanismos intrínsecos do organismo, sem considerar a “psiquê”, a “anima”, seja lá como for chamada a alma, ou espírito ou simplesmente a mente humana, este algo mais que as possibilidades do córtex cerebral. A psicanálise se limita aos fatores determinantes nos primórdios da vida animal, no processo de socialização precoce, o período de adaptação ao mundo, com poucas alternativas para um melhor desenvolvimento a partir de uma mente mais madura.

Além da visão integral do homem (corpo e mente), rompendo a dicotomia cartesiana que dominou a ciência por algum tempo, a concepção humanista valoriza a integração dos sentimentos do corpo e da mente num movimento dito “organísmico” a unidade indissolúvel do organismo animal com a “anima” a alma. É a soma do um mais um que continua ser um. Poder-se-ia até continuar esse raciocínio “matemático” acrescentando outros “uns” tais como o meio físico percebido pela pessoa, o meio social percebido pela pessoa, que são todos únicos tal a percepção única que cada um detém. A soma de todos esses “uns” continuam a ser “um”, e por isso cada ser humano é único em sua plenitude.

O homem é um ser em desenvolvimento, não determinado, tendente à realização, promotor de seu próprio destino embora dentro das limitações físicas de suas possibilidades corpóreas (possibilidades essas que limitaram os estudos laboratoriais do behaviorismo), e dentro das limitações dos conhecimentos iniciais, os primeiros aprendizados da vida (aprendizados que foram o foco das limitações da psicanálise). Fisicamente desprivilegiado perante outros animais, onde seria exterminado no processo da cadeia alimentar, teve um desenvolvimento diferenciado pelo ganho de um mecanismo intelectual, possibilitado pelo desenvolvimento do córtex cerebral (e talvez algo mais), que o fez entender a necessidade de um desenvolvimento organizacional social. Se essa condição é um determinismo, superou tal determinação ao inventar relações afetivas além das necessárias ao próprio sustento e sobrevivência.

Diferenciando-se de outros animais na cadeia evolutiva, não tanto pela matéria química que é a mesma, nem pela estrutura genética tão parecida, mas pelas construções mentais, pela interpretação dos sentimentos, pelo desenvolvimento de valores, tais como o altruísmo que é maior que o valor da conservação da própria vida, algo inconcebível em qualquer outro animal.

O conceito básico de humanismo parte da afirmação “o homem é a medida de todas as coisas” já na Grécia Antiga, onde o homem tem a coragem de se libertar do poder dos deuses para se dizer a si próprio como sendo mentor do seu próprio destino, além de se fazer unidade de medida de todo o resto. O mundo deixa de ser visto a partir do cosmo, para ter origem dentro de cada um, o que lhe proporcionou superar tentativas posteriores (ao longo da história) que tentaram reduzir a vida humana ao um determinismo religioso (Idade Média) e depois ao um determinismo científico (Idade Moderna). No final deste século (Idade Contemporânea), o homem começa a se defrontar com os determinismos todos, rompendo com organizações tradicionais (escola, família, igreja, estado) e buscando seu eu interior para uma integração possível na relação “eu e outro”. Não é uma apologia do individualismo, mas um desenvolvimento o ser em si na relação com o outro. O individualismo seria uma visão voltada para si, enquanto esta é a forma mais saudável, é a visão a partir de si, do auto conhecimento, do auto desenvolvimento, auto realização, sem desconsiderar tudo mais que faz parte de todas as suas relações.

A Abordagem Centrada na Pessoa, assim chamada a linha de trabalho desenvolvida por Rogers, só não é redundante função das outras abordagens, pois não se conceberia qualquer ciência psicológica que não fosse “centrada na pessoa”.  A pessoa é o centro de tudo, cada pessoa é o centro de tudo (pelo menos para ela), e qualquer estudo que tivesse como objeto, seja o comportamento ou o sentimento humano, não poderia deixar de ter como unidade de enfoque a própria pessoa. Só não concordam com isso aqueles que pretendem submeter os outros aos seus próprios valores.

A psicologia humanista é essa vertente que reconhece esses fatos e procura proporcionar à pessoa (quanto em terapia) um clima favorável para o auto entendimento, o auto conhecimento e até a auto realização. A psicologia humanista enquanto parâmetro de procedimentos coletivos procura proporcionar esses mesmos movimentos nos grupos de atuação. Encerrando esse enfoque inicial, a psicologia humanista é uma ciência libertadora no sentido de permitir ao homem tomar as rédeas do próprio destino, resvalando até numa visão libertária, anárquica, na medida em que faz de si o próprio modelo. Por ser uma atividade também inteligente, além da manifestação organísmica, apreende também o sentido do outro, a existência do outro, e se organiza no respeito mútuo, levando em conta a necessidade do outro, embora entendendo a própria responsabilidade nessa relação, seja organizacional, seja afetiva.

Esta entrada foi publicada em Psicologia. Adicione o link permanente aos seus favoritos.