Introdução à psicanálise

No final do século XIX, mesmo para os assuntos de alma e emoções, os cientistas acreditavam que tudo acabaria sendo explicado pela ciência materialista e positivista, tal como se preconizava nas ciências físicas e biológicas. Os avanços da física, da química, da biologia, levavam a crer nas possibilidades infinitas das ciências inclusive no meio médico.

Sigmund Freud (1856 – 1939) nasceu na Moravia (hoje República Checa) e viveu desde os quatro anos em Viena – Áustria. Formado médico (1881) especializou em psiquiatria, optou pela clínica em neurologia, cuidando de pessoas que sofriam enfermidades mentais, ou como se dizia “problemas de nervos”. Sem conseguir explicar muitos dos casos que se lhe apresentavam, procurou formas não convencionais na medicina da época. Esteve estudando hipnose em Paris com o famoso Jean Martin Charcot, trabalhou com a hipnose durante algum tempo e depois elaborou o próprio método – a psicanálise. Enfrentou muita oposição no meio científico, notadamente dos seus pares os médicos.

Freud tinha uma visão pessimista e sofredora do mundo, talvez por trabalhar somente com pessoas doentes. Eis que declarou (Freud, 1997:25):

O sofrimento nos ameaça a partir de três direções: de nosso próprio corpo, condenado a decadência e à dissolução, e que nem mesmo pode dispensar o sofrimento e a ansiedade como sinais de advertência; do mundo externo, que pode voltar contra nós com forças de destruição esmagadoras e impiedosas; e, finalmente, de nossos relacionamentos com outros homens. O sofrimento que provém dessa última fonte talvez nos seja mais penoso do que qualquer outro. Tendemos a encará-lo como uma espécie de acréscimo gratuito, embora ele não possa ser menos fatidicamente inevitável do que o sofrimento oriundo de outras fontes.

Enquanto método investigativo, a psicanálise se caracteriza pelo método interpretativo, buscando o significado oculto daquilo que é manifestado por meio de ações e palavras, ou até pelos sonhos, delírios ou produções imaginativas. (Bock, 2002)

A análise se dá a partir de associações livres de conteúdos manifestos, de atos falhos e até da ausência ou supressão de falas, uma exploração do latente. O paciente é orientado a não fazer críticas aos pensamentos para que possam ser verbalizados do jeito que aparecerem, para que fluam normalmente. O que não consegue fluir normalmente foi chamado por Freud por movimento de resistência. A resistência é sinal que o tratamento está indo em direção certa e que o terapeuta deve caminhar no sentido dessas revelações.

Quanto aos sonhos, Freud achava que representavam de forma simbólica os desejos reprimidos, os conflitos, sentimentos que não podendo ser realizados se anunciavam através dos sonhos. Privilegiou a interpretação dos sonhos como material de trabalho analítico.

Os conceitos psicanalíticos

Segundo Freud os estados de consciência seria: Inconsciente, pré-consciente ou subconsciente e consciente.

Inconsciente: são conteúdos reprimidos, não sabidos nem controlados pelo indivíduo, podem ter sido “levados para lá”, ou “nascidos lá”. Tem leis próprias de funcionamento onde o tempo ou espaço não existem.

Pré-consciente ou subconsciente – algo intermediário entre o inconsciente e o consciente e que pode ou não ser acessado pelo indivíduo, dependendo do momento.

Consciente: é o sistema psíquico do indivíduo que está em contato com a realidade interior e a realidade exterior, destacando-se os fenômenos da percepção, da atenção e o raciocínio. Segundo Freud, o consciente não representa mais que dez por cento do total.

Conforme Schultz (2004:47):

Os instintos são elementos básicos da personalidade, as forças motivadoras que impulsionam o comportamento e determinam o seu rumo. O termo alemão de Freud para este conceito é Trieb, que é mais bem traduzido como força impulsora ou impulso.

Freud colocava o instinto como representações mentais de estímulos internos, como a fome ou sede, que levam uma pessoa a tomar determinadas decisões, transformando uma necessidade do corpo em um desejo da mente. Conforme Schultz (2004:47):

As pessoas podem percorrer trilhas diferentes par satisfazer as suas necessidades. Por exemplo, o impulso sexual pode ser satisfeito pelo comportamento heterossexual, homossexual ou auto sexual ou ser canalizado para outra forma de atividade. Freud achava que a energia psíquica poder ser deslocada para objetos substitutos e esse deslocamento era de extrema importância para determinar a personalidade de uma pessoa.

Freud fala de instintos de Vida e instintos de Morte, um que tende manter a vida e outro que tende à destruição. A energia psíquica manifestada pelo instinto de vida é a LIBIDO, que induz a pessoa para situações prazerosas. Segundo Freud a libido maior é a sexualidade. No instinto de morte aparecem os comportamentos agressivos, a dominação e subjugação.

Numa segunda teoria, Freud apresenta outra estrutura para o aparelho psíquico:

Id, Ego e Superego.

Id (isto, em alemão) – é basicamente a essência do princípio do prazer e totalmente inconsciente, age de forma impulsiva, amoral, insistente e sem censura.

Superego – representa o aspecto moral da personalidade, a introjeção de valores e padrões da família e da sociedade. Tem uma parte consciente, mas é na maior parte inconsciente.

Ego – é o aspecto racional, controlado pelo princípio de realidade, controla os instintos. Freud dizia que o ego sofria de três perigos: o id, a realidade e o supergo, resultando no aparecimento da ansiedade.

Para Freud a ansiedade é um temor sem um motivo aparente. Apresenta três tipos de ansiedade: objetiva, neurótica e moral.

Objetiva (ou frente à realidade) – diante a possibilidades reais de perigo;

Neurótica – originada nos conflitos da infância, um medo inconsciente da possibilidade da punição ante aos desejos do id.

Moral – o confronto entre o id e o supergo, o medo da própria consciência, da vergonha ou da culpa.

Para se defender das ansiedades o indivíduo desenvolve mecanismos de defesa, estratégias para dirimir os conflitos: repressão, negação, reação, projeção, regressão, racionalização, deslocamento e sublimação. No fundo é uma mentira para si mesmo.

Repressão – um tipo de esquecimento involuntário de algo que não faz bem, de algo que traz constrangimento ou sofrimento.

Negação – uma oposição ao princípio de realidade, negando uma evidência.

Reação (ou formação de reação) – a elaboração de um comportamento contrário ao princípio de desejo, para anular as forças indesejáveis.

Projeção – Atribuição do desejo a outra pessoa.

Regressão – a volta a uma fase mais segura, normalmente uma infância idealizada.

Racionalização – a reinterpretação do comportamento de uma forma aceitável.

Deslocamento – substitui o objeto de desejo ou de ódio, por outro menos representativo

Sublimação – a energia e deslocada para atividades mais nobres.

Freud estabeleceu estágios psicossexuais do desenvolvimento da personalidade e os problemas com a fixação:

Oral (0-1 ano) – O prazer é obtido pela sucção. O id é predominante

Anal (1-3 anos) – O treinamento dos hábitos de higiene, o controle esfincteriano. A gratificação social do ato aprendido.

Fálico (4-5 anos) – Fantasias incestuosas, complexo de Édipo, ansiedade, desenvolvimento o superego.

Latência (5 – 12 anos) – Sublimação dos instintos sexuais

Genital (12- …) – desenvolvimento da identidade sexual e relações sociais adultas.

Finalmente, a partir de Freud e seus primeiros colaboradores Carl Jung e Alfred Adler, surgem diversas variações sobre o mesmo tema. Mesmo Jung e Adler logo se distanciaram do mestre por discordarem da exagerada atribuição ao fator sexual.

Jung parte para a exploração dos arquétipos, dos complexos, do consciente coletivo, etc; enquanto Adler se volta para os complexos de inferioridade e de superioridade, onde a tônica da motivação é o poder.

Glossário

Ansiedade – estado afetivo penoso, caracterizado pela expectativa de algum perigo que se revela indeterminado e impreciso, e diante do qual o indivíduo se julga indefeso. (Houaiss, 2001)

Fixação: Estado no qual uma parte da libido permanece investida em uma das fases psicossexuais devido a frustração ou satisfação excessiva. (Schultz:2004:56)

Latente – que existe em forma adormecida ou reprimida; encoberto, subentendido, disfarçado (Houaiss, 2001)

Manifesto – que está em posição conveniente para ser visto; impossível de ser oculto ou dissimulado, que não pode ser contestado em sua natureza, existência; flagrante, indiscutível, inegável; declarado, notório; claro, patente, evidente. (Houaiss, 2001)

Positivista – sistema criado por Auguste Comte (1798-1857), e desenvolvido por inúmeros epígonos, que se propõe a ordenar as ciências experimentais, considerando-as o modelo por excelência do conhecimento humano, em detrimento das especulações metafísicas ou teológicas; filosofia positiva, comtismo (Houaiss, 2001)

Referências Bibliográficas

BOCK, Ana Mercês Bahia; FURTADO, Odair e TEIXEIRA, Maria de Lourdes Trassi. Psicologias – uma introdução ao estudo de psicologia. 13ª. ed. reform. e ampl. São Paulo: Editora Saraiva, 2002, 368 p.

FREUD, Sigmund. O mal-estar da civilização. Rio de Janeiro: Imago, 1997. 116 p.

HOUAISS, Antonio. Dicionário eletrônico Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro – Editora Objetiva, 2001 [CD]

P.SCHULTZ. Duane. Teorias da personalidade. São Paulo: Pioneira Thomson, 2004. 530 p.

WAELDER, Robert. O pensamento vivo de Freud. São Paulo: Livraria Martins Editora, sd.

 

AdendoÉdipo Rei- Sófocles

(Tragédia de Sófocles, autor clássico que viveu de 496 a 406 a.C.)

Composta por Sófocles, em data ignorada, e particularmente admirada por Aristóteles em sua “Poética”, esta obra-prima da tragédia grega, ilustra a impotência humana diante do destino.

A estória começa quando Édipo, príncipe de Corinto, é insultado por um bêbado, que o acusa de ser filho ilegítimo do Rei Políbios. Embora Políbios procure tranquilizar Édipo, o príncipe, perturbado, recorre ao Oráculo de Píton, mais tarde conhecido como Delfos. O oráculo evita responder à sua dúvida, mas dá a terrível informação de que Édipo está destinado a matar o pai e casar-se com a mãe. Como Édipo não tem a menor intenção de deixar que isso aconteça, ele foge de Corinto e vai para Tebas. E aí começa a tragédia.

Em uma encruzilhada, Édipo depara-se com uma carruagem. À frente vem o arauto, que ordena rudemente a Édipo que se afaste e tenta empurrá-lo para fora da estrada. O príncipe começa uma briga e termina matando todo mundo que nela se envolve. Para sua desgraça, um dos homens que vinha na carruagem era seu pai verdadeiro, o rei Laios de Tebas. Após resolver o enigma da esfinge e salvar Tebas desse flagelo, Édipo é proclamado rei e casa-se com a viúva de Laios, Jocasta, sua mãe verdadeira. Só depois que uma nova maldição cai sobre Tebas – maldição que seria afastada apenas quando o assassino de Laios fosse descoberto e expulso – é que os fatos vêm à tona. Édipo não consegue suportar a verdade e arranca os próprios olhos.

Antes que Édipo tomasse a decisão de fugir da profecia do oráculo, Laios, sua vítima já tinha cometido o mesmo engano. Apolo havia advertido Laios de que seu próprio filho o mataria e, quando Édipo nasceu, o rei mandou perfurar com um cravo um dos pés da criança e abandoná-la em uma montanha. Mas o menino foi encontrado por um pastor e levado ao rei Políbios, que o adotou. Essa foi a origem da confusão de Édipo e foi daí que veio seu nome: “oidípous” significa “pé inflamado”.

 

 

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