No dia 10 de setembro de 1967, era o dia da prova de história no meu primeiro ano do colegial, a professora mandou fazer uma dissertação crítica sobre a “Independência do Brasil”. Poderia ser escolhido qualquer aspecto (histórico, político, econômico, etc.)
Eis o que eu produzi (eu tinha 18 anos):
Dizer sobre a independência do Brasil, criticar a simbologia ou realidade da data, traçar as suas consequências é algo de grandioso, de literário, algo além de minhas parcas possibilidades, de meus conhecimentos. Por outro lado, declamar datas e nomes, correlatar fatos, apresentar história, desponta-se para o desnecessário, para, até, a infantilidade, devido minha dificuldade quanto a dissertação.
Direi pois, o que eu sinto, o que eu vejo e como eu interpreto.
A independência do Brasil será a grande e mal conhecida liberdade quando cada brasileiro se fizer desprendido de tabus, de preconceitos e desânimos; quando nós, de firme propósito, acreditarmos no Brasil, ter esta fé cívica tão escassa neste país.
Opino então para uma formação melhor, uma reforma estrutural.
A liberdade de um termina onde começa o direito do outro. Por sua vez, a cada direito corresponde uma obrigação.
É muita liberdade, muita ousadia mesmo, vir a ferir este assunto; ao qual peço a compreensão da ilustre professora. E como se diz: “a toca é para quem servir”.
Se uma pessoa nasce e cresce num ambiente de vícios, torna-se um viciado; do mesmo modo refiro ao erro moral e ao vício intelectual.
A pessoa que ensina deve, não só, ser catedrático como moralmente autoritário. Não adianta ser literato de valor se não conseguir transmitir a sua obra. Por outro lado, o cidadão tem um dever para com a pátria, quanto à sua colaboração política, governamental, cultural; mas o cidadão “funcionário público” tem dupla obrigação; sendo que o mau funcionário público é o maior criminoso contra todos os outros cidadãos.
Pergunto então, e sinceramente gostaria de obter resposta, o seguinte:
– Porque, certos professores, que deveriam ser os melhores e exemplares cidadãos, não cumprem os seus deveres? Alguns adentram às classes, diante aos homens do amanhã, o Brasil do futuro, resmungando contra o governo, espalhando discórdia; outros trazendo desânimo, pela incapacidade própria, trazendo ao aluno este conformismo mórbido, esta negligência mental. Sem citar nomes, temos professores: complexados, mostrando seus supostos conhecimentos superiores esmagando os alunos; incapazes que desde o início do ano letivo não deram nenhuma aula no sentido próprio da palavra; outros que entram à classe com os espinhos em pé para se precaverem quanto aos ataques dos alunos, precaução esta causada pelo medo de se traírem quanto à capacidade própria; outros não ligam para nada “deixam as águas rolarem”.
Embora não seja preparado para tal crítica, ouso fazê-la pois sinto as dificuldades que tais fatos acarretam.
Peço aos professores que não se enquadram nessas especificações, nessas condições que levarão o Brasil à derrota total, que na missão sublime em que estão comecem a reformar seus infelizes e mal-informados colegas.
É o aluno mal-informado de hoje que dirigirá o Brasil de amanhã.
Se o Brasil não é independente que o seja amanhã, graças aos professores.
Não estou, como já disse, à altura de criticá-los, caros cidadãos, pessoas mais cultas que eu, às quais confiou minha formação moral e cultural.
Talvez esteja eu dizendo asneiras neste caso peço que me instruam e me convençam.
Assim confiarei mais no Brasil e na sua independência.
Espero assim uma explicação.
Santo André, 10 de setembro de 1967.
A nota foi um zero e a professora me levou para conversar com diretora queria saber quais eram os meus interesses. Respondi apenas que eu trabalhava o dia todo e as aulas da noite pouco me acrescentavam. Resolveram então, a diretora e a professora, submeter-me a uma prova oral de história. Foram cinco questões clássicas ( invasão holandesa, capitanias hereditárias, ciclo da cana de açúcar, invasão francesa, e algo mais). Respondi satisfatoriamente todas, ganhei um dez “de história”, que somado ao zero e divido por dois, dera nota cinco, que e acrescentado dois pontos de conceito, fiquei com nota sete.
Eis que minha profecia se realiza: a qualidade de nossos políticos e as notas de nossa educação no PISA (Programme for International Student Assessment).