Aprendizagem

Dai-me Senhor,

Forças para mudar o que deve ser mudado;

Paciência para aceitar o que não pode ser mudado;

Sabedoria para diferenciar uma coisa da outra.

São Francisco de Assis

Transformação

Segundo Pichon-Rivière a aprendizagem é uma apropriação instrumental da realidade para transformar-se e transformá-la. Diz que é um processo dialético na medida em que se gera a necessidade de tornar compatível o velho com o novo. As apropriações ocorrem quando o novo é confrontado com o velho e gera adaptações. Para acomodar as novas informações com os preconceitos já existentes, há necessidade de desestruturar o existente para, no resultado do confronto, elaborar uma nova estrutura. A aprendizagem é sempre um ganho, na medida em que se desenvolve um processo de criação.

Transformar-se diante a realidade, como resultado de aprendizagem é, por exemplo, fazer um novo caminho, pegar um atalho para ir mais rápido ou dar uma grande volta para passear mais.

Transformar a realidade, como resultado de aprendizagem é, por exemplo, cavar um poço para conseguir água, ao invés de só esperar chover.

Dialética

O processo dialético consiste no confronto de uma tese, uma afirmativa, com a sua antítese, uma afirmativa de confronto com a primeira. Ao resolver mudar o trajeto para um caminho mais curto, portanto mais econômico, mais rápido, surgem colocações no sentido contrário, tais como a maior dificuldade de vencer esse terreno que pode ser íngreme, derrapante, perigoso. A qualquer situação que se afirme, pode haver afirmação contrária; como se fosse na lei da física, onde a toda força aplicada corresponde uma força de igual valor no sentido contrário.

Do confronto da tese com a antítese, surgem as adaptações possíveis para resolver a situação e gera o que é chamado de síntese. Convém lembrar que a síntese é efêmera, no momento em que se realiza já se torna uma nova tese que implica no surgimento da nova antítese; e começa tudo de novo.

Para se chegar a um novo conhecimento, elaborar uma aprendizagem, é necessário romper com certos preconceitos, e com “verdades” tidas como definitivas. Para se apreender uma nova situação, elaborar uma nova estrutura, é necessário um desmonte de algumas estruturas antigas, como para rearrumar um armário ou uma prateleira é preciso desfazer a arrumação que havia ali.

Repetindo, a aprendizagem é sempre um ganho, na medida em que desenvolve um processo de criação. Depois de rearranjar todo um armário, tirar e recolocar uma série de coisas, pode-se até perceber que não se conseguiu maior espaço, nem couberam mais coisas, mas ficou a sensação de ter desmontado e remontado tudo, e aprendido com o processo.

Identidade

A formação da identidade ocorre a partir do reconhecimento de uma linha de pensamento que se fortalece, a medida que sofre as mudanças mais significativas sem abalar o sentido e a direção dessa linha central.

Pode-se mudar a cada dia, ser uma pessoa diferente a cada momento, mas sempre ser o mesmo, na medida em que se tem a consciência de estar mudando em função de experiências e aprendizagem. Pode-se absorver características e procedimentos de muitas pessoas e continuar sendo o mesmo, na medida em que sabe estar acrescentando algumas coisas e tirando outras da personalidade, enquanto continua sendo um só e o mesmo indivíduo. Quando se perde o fio condutor central, podem surgir neurose e até psicoses, quando não alguns traços de esquizofrenia.

Insegurança

O processo de aprendizagem promove sempre uma certa insegurança na medida em que São colocados em questão os velhos valores gerando uma possibilidade de perda, antes mesmo de configurar um ganho na troca. É uma situação estressante enquanto coexistem os desejos e os temores, a vontade de fuga e de ataque, ao mesmo tempo. Na tentativa de autopreservar o indivíduo procura resistir ao aprendizado.

Todo movimento promove gasto de energia, causa atrito, produz perdas; no processo de aprendizagem não é diferente. Há o momento em que se é convocado a tomar uma decisão sobre certas atitudes e procedimentos. Tendo um espaço limitado para arrumar as coisas, tem que decidir entre o que fica e o que deverá ser jogado fora. Tendo tempo limitado para diversos procedimentos, precisa decidir o que fazer e o que abandonar.

Psicossomática

não é a toa que muitos estudantes ficam estressados, alguns desenvolvem alergias, insônias, taquicardia, outros até úlceras gástricas, e há ainda quem transfira tudo para o relacionamento afetivo, criando agressões de diversas formas, opressões ou descaso total. É o sofrimento da perda de uma segurança, onde tudo parecia certo e definitivo, quando ainda não se conquistou outro patamar para se fixar.

Professor, olha aí!

Erra quem pensa que aprender é gostoso, aprender é doloroso. O gostoso vem depois quando se usufrui dos novos conhecimentos. O que acontece com muitos é que estão sempre em processo de aprendizagem, de sofrimento, de estresse, pensando que precisam conseguir tudo de uma vez, e cada vez mais rápido.

Feliz é quem tem um mestre que ajuda nesse processo de aprendizagem, minorando os sofrimentos. Na função desse mestre podem estar os professores, pais, amigos, companheiros, etc., São verdadeiros anjos da guarda no processo da aprendizagem.

O melhor aprendizado é aprender viver bem consigo mesmo e com a natureza, inclusive a natureza dos outros.


Rossi, P.S. Aprendizagem. Folha da Mantiqueira , Piracaia, 14 set 1997, p.6

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